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Passando agosto esperando setembro

Naquela manhã de agosto, era tarde demais. Foi a primeira coisa que ele pensou ao cruzar os portões do hospital apoiado náufrago nos ombros dos dois amigos. Anjos da guarda, um de cada lado. Enumerou: tarde demais para a alegria, tarde demais para o amor, para a saúde, para a própria vida, repetia e repetia para dentro sem dizer nada, tentando não olhar os reflexos do sol cinza nos túmulos do outro lado da avenida Dr. Arnaldo. Tentando não ver os túmulos, mas sim a vida louca dos túneis e viadutos desaguando na Paulista, experimentava um riso novo. Pé ante pé, um pouco para não assustar os amigos, um pouco porque não deixava de ser engraçado estar de volta à vertigem metálica daquela cidade à qual, há mais de mês, deixara de pertencer. Vamos comer sushi num japonês que você gosta, disse a moça do lado esquerdo. E ele riu. Depois vamos ao cinema ver o Tom Hanks que você adora, disse o rapaz do lado direito. E ele tornou a rir. Riram os três, um tanto sem graça, porque a partir daquela manhã de agosto, embora os três e todos os outros que já sabiam ou viriam a saber, pois ele tinha o orgulho de nada esconder, tentassem suaves disfarçar, todos sabiam que ele sabia que tinha ficado tarde demais. Para a alegria, repetia, a saúde, a própria vida. Sobretudo para o amor, suspirava. Discreto, pudico, conformado. Nunca-mais O amor era o que mais doía, e de todas as tantas dores, essa a única que jamais confessaria.

Caio F., Depois de Agosto

“Que importa restarem cinzas se a chama foi bela e alta? Em meio aos toros que desabam cantemos a canção das chamas!
Mario Quintana

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Amor Fati

Da euforia à depressão

Eu e o país

Chico manda avisar

Que nada é pra já

Eu corro na chuva da chuva

Ansiosa com sua ausência

Com a falta de pauta estabelecida

De motivos justicáveis

Corretos

Pra tomar uma decisão

O que existe é um jogo

E um jogo pressupõe inimigos

Você nega

Mas você joga

Eu só finjo que sou boa

Mas eu não sei jogar

Não existem motivos concretos pra escolher

Direita ou esquerda

Não existe resultado exato

Colocamos um espelho na frente da sociedade

E todos nós fazemos parte dessa imagem

Da violentíssima trindade
Covardia
Estupidez
Egoísmo
(“Esperança é um urubu pintado de verde” e amarelo)

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